segunda-feira, 7 de julho de 2014

A Avenida Sampaio Vidal (I)

Foto: acervo Comissão Registros Históricos
A coluna Raízes desta semana brinda nossos queridos leitores com mais um texto retirado do livro “Estradas e Ruas”, de Herculano Pires, editado no ano de 1943. Nesta publicação, ele fez uma reportagem lírica sobre Marília, Bauru, e da Alta Paulista.
No texto “Wall Street”, o autor descreve a pujança da economia na época dos fatos e o reflexo do comércio vibrante, na atitude das pessoas, na visão de consumo e nas fortes mudanças que a cidade já experimentava, isto ainda com 14 anos de sua fundação. Chamou a minha atenção o número de agências bancárias na época.
Como diz o meu amigo Antonio Beiro, pioneiro, bancário e radialista: “banco só vai e fica onde tem dinheiro!”.
Não é de hoje nossa vocação para ser liderança regional, não é um mero acaso nossa economia pujante, não é de hoje nosso desejo de assumir, com total legitimidade, a condição de “Capital Nacional do Alimento”.
Na próxima edição, vamos mostrar a Sampaio Vidal de hoje, da Marília mulher, que completou 85 anos de vida, com o mesmo brilho nos olhos de quando, ainda menina, encantou os corações dos coronéis do café e do algodão. Como também encantou poetas urbanos, mencionando aqui Herculano Pires, José Arnaldo, Paula Lara, Flávio Sampieri, Anselmo Scarano, entre tantos outros.

Wall Street - Herculano Pires
Três, quatro, cinco, seis carroças vêm descendo a avenida, num barulho que aturde e que ensurdece!
Carroças vazias, burrinhos lépidos puxando-as alegres, cobertos de sol, sob o céu da manhã. (Marília, - depois da guerra, onde que escondeste os teus automóveis de luxo?)
O carroção de rodas pneumáticas da “Destilaria Basta” passa chocalhando os garrafões de água clara do poço artesiano. (Dizem que água de torneira dá úlceras no estômago...)
A polaca opilada, filhinho nos braços, madrugou esmolando na “Brasserie” repleta de homens de negócio e rapazes elegantes. O Prefeito de Vera Cruz passou agora mesmo, riscando o calçamento, num automóvel bonito, que arrasta na traseira um aparelho de gasogênio da Comissão Estadual.
As crianças formigam nas calçadas largas, alvoroçadas e alegres, vestidinhas de limpeza, iluminadas de sorrisos! Nem o sol é mais claro que as suas almas contentes!
Os homens de dinheiro (Não há disso em Marília!), os homens de trabalho, audaciosos como a cidade-menina, que já passou às velhas e as moças, sobem e descem pelo burburinho da Avenida, trocando cumprimentos alegres, abraços camaradas, apertos de mãos e palmadas nas costas, sorrisos amigos e grandes propostas.
Arquivo Comissão de Registros Históricos
Os Bancos da Avenida (Banco do Estado, Brasileiro de Descontos, Comércio e Indústria, Casa Bancária Ruiz, Banco Noroeste, América do Sul, Comercial, Cooperativo Agrícola, Banco do Brasil, - esta é a Wall Street da Alta Paulista!) estão cheios de compradores de algodão, de café e de arroz, cheios de advogados e sitiantes, brasileiros, japoneses, espanhóis, polacos, portugueses, todas as raças e cores que trabalham nas terras de pau-d'alho da zona!
Que espécie de gasogênio é aquele, no automóvel verde que virou a esquina, atrás da carrocinha de leite?
As meninas de saia azul, de traje colegial, jogam bilboquê na calçada do Zico-Alfaiate, e o Carrijo atravessa o movimento da avenida, com os óculos cheios de reflexos do sol, chicoteando o cavalo esbelto da charrete.
A Avenida 10 de Novembro - coração de Marília, Wall Street da Alta Paulista, centro vivo de forças que irradia o progresso para toda região! - se eu fosse o dr. Zoroastro, que está passando, neste momento, em frente ao Bar Odeon , e que tem um horror passadista por estes versos malucos, faria um poema em teu louvor, com todas as regras da métrica, com todas as rimas da regra, com toda a beleza disciplinada da gramática, vibrando na força das palavras que pintam as coisas com o verniz da imaginação!
Mas quê, minha Avenida! você não cabe na velha poesia que cantava a Marília mineira de Ouro Preto!
Porque você não tem métrica! Nem rimas! Nem regras! Nem gramática!
“Você é uma coisa louca”, minha linda Avenida, como disse, ainda há pouco, o menino da esquina!
E só pode mesmo caber, com toda a sua vida e com toda a sua luz, nos olhos sem medidas da poesia moderna, que possuem o milagre da visão simultânea! (o texto do Herculano encerra acima, abaixo um registro sobre a denominação)
* A Avenida Sampaio Vidal sofreu modificações em sua denominação quando da administração do Dr. Aristóteles Ananias Maurício Garcia em 1939, que atendo-se à legislação da época que não permitia ser dado nome à via pública de pessoa viva, deu-lhe o nome de “Dez de Novembro” em homenagem a data do Golpe do Estado Novo. Já na administração do Dr. José Coriolano de Carvalho em 1932, este mais criterioso, conservou-lhe o nome atribuindo a homenagem à esposa do já falecido Bento de Abreu Sampaio Vidal, embora a falecida se denominasse “Maria Izabel Botelho de Abreu Sampaio, não usando o sobrenome 'Vidal'”.
Arquivo Comissão de Registros Históricos
A denominação “Dez de Novembro” não substituiu por muito tempo, tendo sido a antiga e primitiva denominação restabelecida quando da gestão do Dr. Miguel Argollo Ferrão.
Interessante saber e registrar que a principal avenida da cidade presta justa homenagem à esposa de Bento de Abreu, quando muitos acreditavam que a homenagem seria a ele dirigida.





Ivan Evangelista Jr.
Membro da Comissão de Registros Históricos de Marília
Publicado no Jornal Diário de Marília em 20/04/14 

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